Powered By Blogger

15.11.09

A infinita margem do rio

Nasci. Isso foi tudo e mais um pouco. E então me fui. Tormento e aventura, mares e travessias. Rio de margens infinitas. Com quantos paus se faz uma canoa? Pergunto ao rio. Ele ficou lá, impassível nos ruídosdágua da sua correnteza, alheio a qualquer coisa que lembrasse um entendimento.

13.11.09

micro ensaio sobre o amor

o amor? a partilha das horas infinitas enquanto durem, um momentâneo e maravilhoso salto sobre o abismo da escuridão, é a luz, mesmo quando consome. a consciência e o espanto de estarmos vivos, entregues ao tecido mais intenso das horas, com a lucidez dos que acabaram de acordar

Coisas não-ditas, demônios descontentes e beterrabas

O terceiro livro é o mais interessante dos três. Trata-se da coletânea de contos O doce vermelho das beterrabas, de João Batista Ferreira (nascido em 1959, gaúcho radicado em São Paulo). O prefácio é do saudoso Caio Fernando Abreu (na verdade, é um trecho de uma coletânea de novos autores paulistas que ainda hoje permanece inédita) e a orelha é de Marcelino Freire. Isso poderia servir como desculpa para tentar trazer um verniz de "relevância" pros contos de João Batista, mas nem precisava, porque os textos são, em sua maioria, irretocáveis (Dos dezessete contos, eu talvez tirasse 3 ou 4 para deixar o livro mais coeso e candidatá-lo ao rol dos livros do ano).

O livro inteiro exala um sentimento de perplexidade bittersweet, uma solidão incomensurável, um estado de "perda de si" nos personagens, e é tudo tão intenso que a gente começa a se questionar se estamos diante do livro de um "estreante". Mesmo quando os contos lembram um pouco Caio Fernando (sim, João Batista "apareceu" numa oficina literária ministrada por Caio no comecinho dos 90), como a epifania da enorme Júlia, com suas mãos pequenas, em "Leveza", a narrativa é conduzida de maneira bastante comedida, precisa, despreparando o leitor para o choque com o inevitável de cada um.

Eu disse "despreparando", e isso pode ser tomado como um elogio: João Batista Ferreira consegue, em diversos momentos, tirar a sensação de conforto do leitor, coloca-lo em choque com as arestas da narrativa, e essa experiência é de uma beleza cada vez mais rara na produção contemporânea, muito mais preocupada em reforçar uma (des)filiação a determinada tribo e a falar do mundinho "quarto-e-sala-na-zona-sul" que cansa a todo mundo que não vive num quarto e sala na Zona Sul do Rio.


Foto: Divulgação

"Flor" fala da obsessão de uma filha em repetir, a vida inteira, o desenho de uma flor proposto pelo pai na sua tenra infância, copiando-o nos mínimos detalhes. "Aniversário" consegue, logo nas primeiras linhas, fazer transbordar a riqueza do universo de uma secretária executiva quarentona e solteirona. Do conto que dá título ao livro, talvez o melhor de todos (e desde já um clássico), eu nem vou dizer nada, só vou me limitar a repetir o trecho que o Marcelino Freire cita na orelha do livro:

"- Carneirinhos?
- É. Contei quase trinta mil.
- E adormeceu?
- Não. Amanheceu."

Acho que, depois disso, tenho bem pouco a dizer. Vou ficar aqui, no meu cantinho, aguardando os próximos livros desses autores, cujas estréias valem a pena. Enquanto isso, fica a dica para o Natal: dê O doce vermelho das beterrabas de presente. Nem que seja pra você mesmo(a).
Erly Vieira Jr.

10.11.09

o livro do mundo

mal sabemos do outro lado do instante-seguinte, a cor do ar que respiramos, nem o segredo das partículas que levam tua voz pelo mundo.
toca o momento que passa, mergulha no hora-segundo que desliza sobre a superfície misteriosa das horas, do tempo-estranho-infinito.
já-passou o instante que mal vi, vemos, tocamos, sentimos o cheiro, o instante é uma linha invisível no tempo, mas bem perto da palma da mão.
o instante-agora já está no passado quando escrevo esta palavras no futuro que se tornou presente e escorrem em direção ao passado.
o livro do mundo foi escrito numa linguagem que, para ser lida, precisa ser reinventada todos os dias, reescrita a cada novo instante

9.11.09

os muitos muros do mundo

o muro dos mundos sem fim, os mundos emoldurados ao infinito pela violência, a discriminação, a intolerância pregada nos muros da escuridão, há muitos muros por aí, aqui bem próximos, os muros que envolvem muros sem fim, o muro-preconceito é maior que a muralha da China

29.8.09

mil faces secretas sob a face neutra

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível que lhe deres:
Trouxeste a chave?
Carlos Drummond de Andrade

15.7.09

Escola é dominada por preconceitos, revela pesquisa - Vida & - Estadão.com.br

Pesquisa sobre preconceito e discriminação no ambiente escolar | FEA-USP

Pesquisa sobre preconceito e discriminação no ambiente escolar | FEA-USP

Justiça do Trabalho manda Unibanco pagar indenização de R$ 1 milhão

O juiz do Trabalho, Carlos Hindemburg de Figueiredo, da 9ª Vara do Trabalho de João Pessoa, condenou o UNIBANCO - UNIÃO DE BANCOS BRASILEIROS S/A a pagar a um ex-empregado seu indenização por danos morais no custo de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).

O caso em análise versava sobre assédio moral decorrente de excessiva jornada, o que teria causado esgotamento físico e mental no bancário que, ao final, postulou o reconhecimento da rescisão indireta do seu contrato de trabalho em reclamação trabalhista anterior. O autor da ação postulou, além da indenização pela inobservância às normas de limitação de jornada, o reconhecimento da responsabilidade civil do seu ex-empregador pela inclusão do seu nome em "lista negra", dificultando-lhe a obtenção de novo posto de trabalho.

Em sua decisão, o Juiz Carlos Hindemburg explicou que o assédio moral é "também conhecido como mobbing (nos países de língua escandinava e de língua germânica) e bullying (nos países de língua inglesa)", caracterizando-se como "comportamento reprovável que, como dito, gera penosas conseqüências à vítima. A doutrina que lida com o tema é categórica ao destacar os efeitos que podem decorrer do assédio moral: O/A trabalhador/a humilhado/a ou constrangido/a passa a vivenciar depressão, angústia, distúrbios do sono, conflitos internos e sentimentos confusos que reafirmam o sentimento de fracasso e inutilidade". Na oportunidade, o magistrado ressaltou ainda que "as consequências do assédio moral não se restringem apenas ao âmbito individual da vítima. Espalha-se pela esfera que inclui aqueles que com ela (vítima) convivem mais intimamente, gerando potencial desgaste, alimentado de moto próprio". Em seu julgado, rejeitou a tese de que o pagamento de horas extras eliminaria o dano imposto pela excessiva jornada laboral, na medida em que "As conseqüências jurídicas decorrentes de um fato de origem comum são diversas, possibilitando o requerimento de títulos diversos".

O Juiz constatou, segundo a prova dos autos, inclusive documento de avaliação de médico vinculado ao banco, que o reclamante chegou quase a ter esgotamento físico/mental, também conhecido como síndrome de burn out. “É dever do empregador proporcionar ao empregado um meio ambiente laboral sadio, o que inclui a obrigação de não violar o direito à saúde do trabalhador”.

De acordo com o juiz Carlos Hindemburg, casos de indenização por danos morais não são novidades no Poder Judiciário Trabalhista. No entanto, a decisão traz um certo grau de ineditismo na medida em que aprecia e defere pedido de indenização que envolve violação do direito fundamental ao lazer (Constituição Federal, artigo 6º), matéria rara de ser vista no âmbito da Justiça do Trabalho.

Em sua conclusão, o magistrado levou em conta elementos como a permanência temporal do sofrimento, a extensão do fato lamentado, a gravidade do ato doloso e a situação econômica do ofensor, salientando ainda o caráter pedagógico da pena para fixar a indenização por danos morais em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), distribuídos da seguinte forma: a) R$ 400.000,00 decorrentes do assédio moral sofrido; b) R$ 400.000,00 decorrentes da obstaculação ao emprego, e c) R$ 200.000,00 decorrentes da violação ao direito fundamental ao lazer. À decisão cabe recurso.

www.pbagora.com.br/conteudo.php?id=20090714135153

7.7.09

"Perdi um jeito de sorrir que eu tinha" na Revista Mente e Cérebro de julho 2009

A Revista Mente e Cérebro de julho 2009 traz uma comentário bacana sobre o livro:
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha: violência, assédio moral e servidão voluntária no trabalho. O comentário não está disponível na edição da revista na internet.

19.4.09

Uma ronda utópica - mais um belo texto de Edson Sousa







18 de abril de 2009 | N° 15943 publicado na Zero HoraAlertaENSINO

Professores, estudantes e funcionários da Universidade de Paris 8 se revezam em ininterruptas caminhadas de protesto contra os novos e polêmicos projetos de lei do governo Nicolas Sarkozy

“O elemento milagroso que nos alegra, pode ser simplesmente o raio do sol que, numa manhã de primavera, transfigura uma rua miserável”
Georges Bataille

Capturados que estamos em uma lógica utilitarista, somos tentados a abandonar rapidamente tudo aquilo cujo sentido nos escapa, anestesiando, em nós e no mundo, os atos que tentam recuperar a força milagrosa daquilo que nos surpreende como promessa de futuro. Sem esta possibilidade de sonhar com outras configurações de mundo, a vida se reduziria a uma repetição sombria. A passividade que nos aprisiona faz a alegria daqueles que usufruem soberanamente de nossa paralisia. Portanto, um dos grandes desafios de nossos tempos é manter viva a esperança de mudanças estruturais em nosso laço social, uma vez que o ar do novo liberalismo (que veio para ficar) não tolera nenhuma crítica. Como poderíamos nos opor a um estilo de viver que se outorga a qualidade de ser um prolongamento de nossa natureza? Ressoa ainda a apocalíptica afirmação de Margareth Thatcher “there is no alternative”, defendendo assim uma economia que, sob a bandeira de uma liberdade de mercado, tenta solapar nosso potencial crítico. Este panorama é assustador e o descrédito do próprio fazer político é uma das consequências trágicas deste cenário. Noam Chomsky, em seu ensaio “Sobre o controle de nossas vidas”, aponta com precisão este horizonte quando mostra o quanto o povo é considerado como “estrangeiros ao sistema, ignorantes e inoportunos” e que deveria se contentar com o lugar de espectadores e não de participantes. Ironicamente, ele mostra que sempre que aumenta a participação popular o poder sabe bem como nomear tal perturbação: trata-se de uma “crise da democracia”. Contudo, ainda encontramos alguns que se recusam a andar nesta direção e buscam algum desvio na contramão das pequenas ruas miseráveis.

Diante de um dos símbolos do poder político de Paris, o monumental prédio da prefeitura às margens do Sena, centenas de pessoas de revezam em uma caminhada ininterrupta em um grande círculo. Este movimento começou no dia 23 de março ao meio-dia e não tem data para acabar, razão pela qual se autodenominou como “ronda infinita dos obstinados”. Esta iniciativa partiu de um coletivo de professores, estudantes e funcionários da Universidade de Paris 8, em protesto aos novos projetos de lei para o ensino superior propostos pelo governo de Nicolas Sarkozy. Muitas outras universidades aderiram à proposta e a ronda tomou uma proporção inesperada, já se espalhando por muitas cidades francesas: Amiens, Lyon, Toulouse, Montpellier, Fort-de-France entre outras. Estas medidas, uma vez implantadas, vão mudar drasticamente o perfil da universidade francesa com substanciais cortes de orçamento, diminuição de vagas, proposta de uma “autonomia” que abrirá ainda mais as portas da universidade à iniciativa privada e o fim do estatuto de professor-pesquisador. Não é preciso ter muito conhecimento de economia para saber o custo que tais políticas provocarão na pesquisa e no ensino. Por isto, um dos slogans que podemos ler na praça do “hotel de ville” é : “Não, a universidade não é uma empresa nem o saber uma mercadoria”.

O grande relógio da prefeitura também gira em seu pulsar contínuo e testemunha o tempo que ali se escreve. Cada hora é escrita em giz branco em um pequeno quadro-negro no centro do círculo. O relógio desenhado no tempo do caminhar tem dezenas de ponteiros e não há hierarquia entre eles. Já são mais de 400 horas de caminhada dia e noite, energia anônima em movimento, como uma maré que invade o espaço da cidade. A imagem de obstinação deste caminhar sem principio, nem fim, faz corte nos círculos viciosos do poder que insiste em dizer que nada está acontecendo. Lâmina fulminante no olho do governo como a cena inicial do clássico filme de Bunuel O Cão Andaluz. Portanto , uma luz que anda mesmo no escuro. Quando chove, a ronda desenha no chão o traço vivo do círculo como uma escritura efêmera de um olho imenso que insiste em querer ver. O movimento surgiu a partir de uma ideia do professor Denis Guedj como forma de reagir à indiferença do governo às reivindicações dos professores e estudantes universitários em greve há mais de dois meses. Em recente artigo no jornal Libération (8 de abril) ele justifica o sentido da proposta : “Como dizia Deleuze, nós giramos por aqueles que não giram. Não em seu lugar mas por sua intenção”. Assim, esta ronda interpela por sua abertura à estagnação de outras circularidades que nos capturam.

Ronda utópica, pois insiste na criação de novos espaços e, sobretudo, uma obstinação pela esperança. O caminhar incessante desenha uma outra relação de forças entre manifestantes e o poder. Foi o que aconteceu com a ronda das mães da Praça de Maio em Buenos Aires, fundamental na história de resistência à ditadura na Argentina , que deixou como saldo macabro mais de 30 mil desaparecidos.

Muitas pessoas que passam pela prefeitura buscam informações sobre o que está acontecendo. Desta forma, os passos anônimos adquirem voz e ampliam a participação popular no movimento. Circunferência inquieta e solidária que nos faz pensar na responsabilidade de cada um para com seu tempo e sua história. A praça da prefeitura tem sido nomeada como praça da greve. A língua francesa permite uma derivação precisa do que ali está se escrevendo: uma praça do sonho (rêve). Como lembra Ernst Bloch, o grande pensador das utopias do século 20, aquele que sonha não fica jamais no mesmo lugar.

* Psicanalista. Professor da UFRGS em pós-doutorado em Paris na Universidade de Paris 7 e na École des Hautes Etudes en Sciences Sociales.

EDSON LUIZ ANDRÉ DE SOUSA *

Textos de Foucault em Português na WEB

Ótima dica do site http://www.unb.br/fe/tef/filoesco/foucault/biblio.html

A Ordem do Discurso, Da amizade como modo de vida, Uma estética da existência, As técnicas de si, Verdade, poder e si, Omnes et Singulatin - para uma crítica da razão política, O filósofo mascarado, Sexo, poder e a política da identidade, Escolha sexual, ato sexual, Além das fronteiras da filosofia, O que é o Iluminismo? Microfísica do Poder, O ocidente e a verdade do sexo, Silêncio, sexo e verdade, Então é importante pensar?, O que é a crítica? [Crítica e Aufklärung], Introdução à vida não fascista, O homem está morto?

O livro PERDI UM JEITO DE SORRIR QUE EU TINHA: VIOLÊNCIA, ASSÉDIO MORAL E SERVIDÃO VOLUNTÁRIA NO TRABALHO está disponível no site www.7letras.com.br. A sinopse está transcrita a seguir:

Um livro que aborda de maneira sensível e surpreendentemente poética um tema complexo e geralmente envolto em silêncio: as relações perversas que se estabelecem no ambiente de trabalho, cada dia mais frequentes na sociedade pós-moderna.

Através de uma bela pesquisa empírica, o autor colhe depoimentos corajosos e fundamentais para o estudo desse novo “mal” contemporâneo, aliando a isso grande consistência teórica. É para o encontro entre ciência e poesia que o leitor é convidado ao abrir as primeiras páginas deste livro que certamente passará a ser referência no tema da psicodinâmica do trabalho.”

O prefácio é da profa. Ana Magnólia Mendes, do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho da UnB.

Entrevista no SBT sobre assédio moral

Entrevista no programa Cidade Viva, do SBT: http://www.youtube.com/watch?v=NFGIMH-fTmg